O histórico encontro entre o presidente norte-americano Donald Trump e o líder da Coreia do Norte Kim Jong-Un parecia impensável há alguns meses. Porém, contra muitas das previsões feitas pelos analistas de política internacional, o encontro acabou acontecendo no último dia 12. A partir dele foram iniciadas as discussões sobre o processo de desnuclearização da Coreia do Norte e, com isso, criada uma janela de diálogo inédita entre os dois países.
É importante ressaltar que o ano de 2017 foi marcado por uma verdadeira “guerra de palavras” entre o líder coreano e o presidente norte-americano. Em alguns momentos, a tensão se elevou a tal ponto, que Trump chegou a afirmar que os Estados Unidos estavam prontos para atacar a Coreia do Norte, caso Kim Jong-Um continuasse com os testes nucleares. Junto a esse cenário de tensão figuravam as personalidades controversas dos dois. Tanto Trump, quanto Kim Jong-Un são conhecidos por terem posicionamentos extremados e polêmicos – quem diria que, pelo menos neste quesito, o líder da maior democracia do mundo e o chefe do Estados mais fechado do globo tivessem tanto em comum. As ameaças eram constantes de ambos os lados e a situação parecia estar escalonando para um conflito direto entre os países.
Apesar dessa conjuntura nada favorável, no início de 2018 se observou um arrefecimento na guerra discursiva empreendida por eles. Essa diminuição nas tensões foi, sobretudo, resultado de uma mudança de postura de Kim Jong-Un em relação à comunidade internacional. O estadista norte-coreano passou a moderar o seu discurso e demonstrar interesse em superar as desavenças históricas com a Coreia do Sul. Essa modificação no comportamento do líder norte-coreano se deu em grande parte pela necessidade de buscar uma solução para os problemas econômicos enfrentados pelo país, muito afetado pelas sanções impostas pelos Estados Unidos e pelas Nações Unidas. A primeira grande estratégia implementada pela Coreia do Norte foi a participação de sua capital Pyongyang nos Jogos Olímpicos de Inverno na Coreia do Sul, sob a bandeira de que aquele poderia ser um evento de paz. A imprevisibilidade e até mesmo a espontaneidade da ação norte-coreana abriu caminho para um encontro com o presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in, e para a promessa de um acordo de paz entre os países.
Diante da possibilidade de paz entre as Coreias e da nova postura de King Jon-Un na política internacional, Donald Trump acabou por aceitar o convite para a Cúpula de Singapura, na qual se reuniu com o líder norte-coreano. O tom do encontro foi amistoso e parece ter selado uma nova página na história das relações diplomáticas entre Estados Unidos e Coreia do Norte. Em termos gerais, foi definido que a Coreia do Norte irá trabalhar em prol da sua desnuclearização e os Estados Unidos irão interromper os exercícios militares com a Coreia do Sul. No entanto, o acordo assinado pelos dois estadistas, em Singapura, ainda parece estar longe de resolver por completo as desavenças acumuladas ao longo dos anos pelas duas nações. Isso ocorre porque as condições para a desnuclearização da Coreia do Norte ainda são vagas e muitos compromissos importantes quando se pensa na estabilização da região ficaram fora do papel. Além disso, Trump e Kim Jong-Un são conhecidos por costumarem não cumprir com os acordos estabelecidos. Por conseguinte, ainda é muito cedo para afirmar que a Cúpula de Singapura representa uma grande virada nas relações entre os Estados Unidos e a Coreia do Norte.
O que se pode afirmar de inicio é que esse encontro se constitui em uma importante vitória da diplomacia norte-coreana. Tanto que os desdobramentos da reunião têm demonstrado que o caminho diplomático foi uma escolha acertada para Pyongyang. Depois de se reunir com Trump, o líder norte-coreano parece buscar agora aproximações com China e Rússia. Esse fato evidencia que os esforços da Coreia do Norte direcionados à inserção internacional do país, com o objetivo de solidificar parcerias econômicas, estão dando certo. A Coreia do Norte, antes chamada de “anão diplomático”, agora senta à mesa com grandes líderes mundiais para discutir a situação econômica da península.
A China tem exercido um papel fundamental em todo esse processo. Não é segredo que o governo chinês não aprova a presença militar norte-americana na península das Coreias e próxima demais do seu território. Essa é uma questão de segurança nacional para China e de interesses estratégicos do país na Ásia. Desse modo, um acordo entre Pyongyang e Washington é de grande interesse chinês, principalmente, pela possibilidade de haver uma futura retirada das tropas norte-americanas da Coreia do Sul.
Portanto, mesmo que não se possam prever as consequências finais da Cúpula de Singapura, já se pode afirmar que ela representa uma vitória da nova diplomacia norte-coreana e da diplomacia estratégica chinesa. Se o encontro levará de fato à desnuclearização da Coreia do Norte e à paz na península das Coreias é algo que somente o tempo deve dizer. Isso porque as relações entre os países ainda são extremamente frágeis e não são poucos os fatores que podem fazer esse acordo desandar, como aconteceu em outros momentos. No entanto, o interesse chinês é um elemento extremamente favorável à estabilização das relações entre Estados Unidos e Coreia do Norte, uma vez que a China configura-se em um grande player mundial e pode corroborar para o sucesso dessa aproximação.
Autora: Natali Hoff é professora no Centro Universitário Internacional (Uninter) nos cursos de Relações Internacionais e Ciências Política; Mestranda em Ciência Política, Especialista em Relações Internacionais Contemporâneas e bacharel em Relações Internacionais e Integração.